Itaquerão
Como se sabe, o Corinthians anunciou a construção de seu estádio para, talvez, sediar a abertura da Copa. Não tenho absolutamente nada contra o conceito dessa obra, afinal de contas a única coisa que eu realmente perderia seria a piada de que o Corinthians não tem estádio, o que é apenas uma meia verdade já que a Fazendinha existe há décadas.
Contudo, não gostaria de ver o dinheiro que eu pago em impostos indo parar na construção de um elefante branco. Em nota oficial do Corinthians, podemos destacar os seguintes trechos:
"Será assinado hoje um pré-contrato com a Organização Odebrecht para a construção de nosso estádio, em Itaquera, com um valor de referência de R$ 335 milhões, com a capacidade para receber 48 mil pessoas."
"Um estudo de demanda, conduzido no primeiro semestre deste ano, revelou uma conclusão nada intuitiva: a perda de arrecadação decorrente de se localizar nosso estádio em Itaquera, em vez do Pacaembu, seria de menos de 20 por cento"
"O estudo de demanda revelava, ademais, que o estádio teria condições de se pagar em menos de três anos, já que a arrecadação total projetada será superior a cem milhões de reais anuais, enquanto o custo total do estádio – dimensionado para até 50 mil espectadores – ficaria perto de trezentos milhões de reais."
Desconfio de valores numéricos por profissão, por hobby e por dever cívico. 350 milhões me parece um custo meio baixo para um estádio novo (na África do Sul o chique estádio de Port Elizabeth , com capacidade para 48000 pessoas, não saiu por menos de 475 milhões de reais) mas aceitemos esse valor.
Por outro lado, dizer que o estádio se pagará em 3 (TRÊS) anos é má-fé ou erro de cálculo. Vejamos as médias de público nos últimos 2 anos:
3 coisas são claras baseando-se nesses dados:
- O povo prefere ir a jogos decisivos, de torneios "que valem mais". A diretoria aproveita para enfiar a faca nos ingressos e as disputas de tiro curto (Copa do Brasil e Libertadores) se tornam bem rentáveis.
- O torcedor não tem dinheiro infinito. Se ele quer ir à Libertadores, deixará de ir ao Paulistão.
- A média em todos os jogos está longe da capacidade máxima do Pacaembu (37000). Não há uma "demanda reprimida" em todos jogos, em 2 anos o Pacaembu lotou apenas 5 vezes.
Assim, é óbvio que construir um estádio para 48 mil pessoas não significa que ele estará cheio toda semana mesmo cobrando-se um absurdo pelos ingressos, não há demanda para isso. Para piorar, o próprio estudo do Corinthians aponta uma queda no público devido à mudança para Itaquera.
O que eu não consigo entender é da onde pode ter surgido essa idéia de 100 milhões de receita por ano. Em média o Corinthians disputa uns 35 jogos em seus domínios por ano. Para conseguir uma receita desse valor, seria preciso ter casa cheia sempre mesmo com um ingresso médio da ordem de R$60. Além disso, há uma enorme diferença entre receita e lucro. Será que os autores do estudo corinthiano não consideraram que a despesa em um simples jogo, mesmo sem pagar aluguel à prefeitura, fica em torno de R$200.000, pelo menos?
Fiz então uma análise de fluxo de caixa. Considerei uma despesa de 335 milhões de reais dividida em 3 partes iguais. Admiti que a receita com ingressos seria 25% maior do que num ano bom (de Libertadores) como 2010, o que daria uma entrada de quase R$40 milhões no primeiro ano de vida útil do estádio. Estou sendo simpático e supondo que o torcedor vai comparecer e pagar caro para conhecer a nova casa. Por outro lado, supus que a despesa por jogo seria de R$250.000.
Somei ainda R$7 milhões por ano de naming rights, já que os contratos na Europa tem girado em torno de 6 milhões de euros/ano (Emirates, Allianz Arena). Com isso, no primeiro ano o estádio traria um lucro de R$37 milhões .
Usando uma taxa de juros de 7% ao ano para trazer tudo a valor presente, temos que o estádio se pagaria em 17 anos. Nenhuma maravilha de investimento, portanto.
Em resumo: estão mentindo para você, Fiel Torcedor. E estão nos roubando, amigo brasileiro.
PS: aceito críticas à metodologia empregada, ao valor da taxa de juros e também aceito sugestões para estimar quanto seria possível lucrar com shows, estacionamento e outros eventos.