All your life, Charlie Brown...
Assim que cheguei no canteiro de obras da caldeira, percebi que aquele era o terceiro pior lugar do mundo que poderiam me colocar para trabalhar - tocador de tuba em parada militar e assistente de dentista de cachorro ainda levam vantagem. Como essa vida é um vale de lágrimas, tratei de enfrentar o caos, o perigo, o calor, a fumaça, o pó, os soldadores malucos e os demais portugueses do local.
Com as férias iminentes de parte dos lusitanos, tive de passar muito além da Taprobana para buscar algo a fazer lá pelos lados do Além-Caldeira 8. O Paulo Silvino e o Pacheco (personagem novo; descrição breve, típico português com bigode "andorinha", com cara de dono de padaria), nas palavras do soldador, "estão a passar os dias a ver quem faz menos". Fato, os caras enrolam o quanto podem. Melhor para mim, ajudar folgado é simples, nesse caso.
Tentando fingir que fazia alguma coisa, fiquei procurando uma pá para recolher o lixo varrido. Como já disse antes, o lugar é meio inóspito, sujo, bagunçado, apertado...Seria uma variante para a agulha no palheiro, a pá na caldeira. Gastei um bom tempo tentando lembrar também como se diz pá
De repente, enfio a mão no bolso e percebo que a chave do meu cadeado tinha sumido. Se achar a pá era impossível, melhor nem falar da chave. Fui falar com o segurança ("não sei onde ela caiu, andei por toda a fábrica procurando uma...um...bom, um negócio"), anunciaram no sistema de som, mas como metade da fábrica fala português, metade fala italiano e o terço restante também não entende francês direito, eu não tinha esperanças.
Antes de sair para jogar o lixo no caminhão de entulho (pois é, virei lixeiro!), ouvi o sistema de som dizer algo como "Santorô". Eles repetiram, prestei mais atenção, era só a ordem para alguém passar no "bureau" (escritório). Quando eu tinha certeza que meu dia não podia ficar pior, veio o chave, digo, o chefe, me mandar para o curso obrigatório de segurança...
Eu e dois operários de outro setor, recém chegados, vimos um vídeo estúpido e depois tivemos que responder questões do nivel CFC. Comecei a pensar besteira durante as perguntas da provinha, inventando novas questões, "O que fazer se você machucar o dedo? Lavar sozinho, chamar um colega, passar na enfermaria ou cortar fora com a rebarbeira pequena?", quase errei umas por falta de atenção. Fui aprovado, com honras, e agora vou receber um selo de segurança no meu capecete.
Não percam, amanhã, em mais um capítulo de "Um operário muito estranho", a revelação de Pacheco e o sonho do soldador...
Um comentário:
O sonho do soldador foi demais... mas lembrar da Taprobana é de fato louvável!!! E viva Dom Sebastião!!! Vivaaaaaaaa..... :-)
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