sexta-feira, julho 16, 2010

A pobreza das nações

Introdução 1: Nunca li Adam Smith. Segundo se conta sobre sua obra, ele dizia que os indivíduos, ao procurar apenas seu benefício próprio, acabavam gerando um maior bem-estar para toda a sociedade.

Introdução 2: Em alguns corredores de ônibus de São Paulo, as pessoas entram por uma porta à esquerda do ônibus, mais ou menos no meio do carro. Com isso, elas têm duas opções depois de embarcar: virar à esquerda e se acomodar perto do motorista ou virar à direita para passar pela catraca.

Dos Fatos: Entrei num ônibus não muito cheio hoje. Junto comigo havia mais uma dúzia de pessoas querendo entrar também. Além da catraca havia apenas uma meia dúzia de lugares. Eu, bem-educado como um francês (se francês fosse exemplo de educação...), fiz comme d'habitude: fui logo me posicionando à esquerda numa fila para passar a catraca, dando assim espaço para todos subirem no ônibus e ele poder partir mais rápido.

O grande problema é que esse meu comportamento praticamente me condenou a ficar em pé, já que todo mundo se precipita em direção à catraca para garantir o assento, na versão adulta e pós-moderna da dança das cadeiras. Os indivíduos, se movidos apenas pela maximização de seu conforto, tendem a se matar pra passar a catraca e garantir um lugar.

Porém, quando todos tentam fazer isso, o ônibus é obrigado a ficar parado esperando que os distintos senhores se acomodem. Se alguém tenta fazer como eu, é imediatamente penalizado pela multidão que passa à sua frente. Ou seja, é do interesse de todos que o ônibus saia rápido mas todos também têm interesse em sabotar essa estratégia.

Na minha experiência, percebo que sempre prevalece a aglomeração perto da catraca e a espera desnecessária. Se as pessoas esperassem em fila DENTRO DO ÔNIBUS, os primeiros teriam seus lugares garantidos e tudo sairia mais rápido, mas a vontade de "levar vantagem" costuma ganhar.

Conclusão 1: ao contrário do que dizia Adam Smith, o interesse individual não necessariamente conduz à satisfação da população como um todo.

Conclusão 2: nenhum teórico do capitalismo já andou de ônibus.

6 comentários:

Rapha disse...

Vamos lá, também não li Adam Smith, e economia não é o meu forte, mas se eu me esforçar um pouco acho que algo que eu estudei em eco longo saí.

Os conceitos de adam smith, são a base da microeconomia, neoclássica, que define que se produtores maximizam a sua função de lucro, e consumidores a sua função de utilidade, então você atinge uma solução ótima para sociedade. Isso é o equilibrio de concorrência perfeita.

Para que isso seja verdade, são admitidas algumas hipóteses:

1) Existe um número muito grande de consumidores e de produtores, todos com o mesmo poder de mercado, insuficiente para afetar o equilibrio

2) cada produtor define a sua produção.

No caso do exemplo do ônibus, o papel do produtor seria o proprio ônibus. Diferente dos produtores considerados em microeconomia, um ônibus cheio não pode criar mais lugares, indpendente da demanda dos passageiros.

Além disso, os consumidores possuem um poder de mercado distinto, afinal, quem pegou o ônibus nos pontos anteriores, pôde se sentar.

Desta maneira, é possível chegar a conclusão que no exemplo do ônibus, não temos um mercado de concorrência perfeita. Desta maneira as idéias de Adam Smith, não serão válidas.

Para esse caso, talvez fosse melhor avaliar por teoria dos jogos, afinal, para mercados de concorrência imperfeita, você teria outros equilibrio, como o equilíbrio de Nash.

Bruno disse...

Concordo, os passageiros precisam decidir se adotam uma estratégia colaborativa ou se desertam dessa para tirar proveito.

O fato é que se eu falasse de Nash não teria graça por dois motivos:

1 - ele teria razão

2 - a conclusão seria: "esquizofrênicos não prestam atenção em ônibus", o que está longe de ser surpreendente.

Arthur disse...

Gostei da analogia com as direções: Esquerda pelo bem comum VS. direita neoliberal pelo bem do indivíduo

Leonardo disse...

O que falta nos ônibus de SP é uma buzina como a do RER e portas que fecham com bastante violência, assim as pessoas vão entrar de qualquer jeito.
Sinceramente, a mentalidade não muda TANTO assim entre SP e Paris (nesse ponto principalmente)...aqui acontece algo similar no RER: ao invés de avançar pelos corredores do trem, onde há algumas janelas e onde se consegue respirar, as pessoas preferem ficar empacotadas perto das portas, "serrées comme des sardines", sem quase ter espaço para respirar. E as que estão do lado de fora, ao ouvir o biiiiiip, entram empurrando e dizendo "pardon pardon" :)

milouse disse...

eu coloco este texto no mesmo patamar de O Pequeno Principe, pois a cada vez q o leio reparo em algo novo

milouse

===
em tempo, nunca li O Pequeno Principe

Tiago disse...

a solução do problema do espaço em qualquer meio de transporte público é uma só: moto-serra