domingo, julho 30, 2006

Alceu

Minha lembrança mais antiga desse obscuro médio volante é algum obscurissimo jogo da Segundona (2003, portanto). Palmeiras e América-MG, acho.

Depois de o cidadão tentar algumas cobranças de falta e acertar a barreira, quando muito, meu pai perguntou quem diabo tinha dito para aquele cara que ele sabia bater falta.

Pois bem, alguns anos e muitas criticas depois o desgraçado acertou uma cobrança. "A" cobrança, é verdade. Mera questão estatistica, depois de 284671 chutes um deles ia dar certo.

Os que ainda não viram, cliquem aqui. Curioso é que essa era a narração que eu estava ouvindo na hora, a melhor parte é o "pra sair do estadio, comprar ingresso de novo e começar tudo outra vez", hahaha.

terça-feira, julho 25, 2006

É nossa, porra!

Cessem as histórias dos sábios portugueses que um fato novo mais alto se alevanta: colocaram o Dunga de técnico da Seleção.

Isso mesmo, caro leitor do futuro, o Dunga foi técnico do Brasil um dia. É, aquele mesmo Dunga, aquele que foi capitão em 94. Isso, também é aquele que virou símbolo de fracasso em 90. Claro, querido leitor, não existem tantos Dungas por aí a jogar bola (estou a virar lusitano...).

É o tipo de fato tão esdrúxulo e inesperado que fica aqui no blog mais como registro temporal, definindo uma espécie de novo calendário. "Não, tenho certeza que o Corinthians só foi rebaixado uns meses depois que o Dunga assumiu", dirão os leitores do futuro.

Tudo isso, claro, se houver futuro, porque quando o país do futebol coloca um Dunga no comando é um sinal evidente do Apocalipse.

PS: é até possível que o referido gnomo dê certo na seleção, afinal ele é uma espécie de Felipão genérico. Pode levar uns dias a mais para curar um resfriado mas como foi mais barato aceitamos...Além do mais, meus posts proféticos têm o dom de mudar o futuro para que aconteça o contrário do previsto. Agradeçam-me se ganharmos o hexa ou me dêem os parabéns quando ele for demitido.

segunda-feira, julho 24, 2006

All your life, Charlie Brown...

Assim que cheguei no canteiro de obras da caldeira, percebi que aquele era o terceiro pior lugar do mundo que poderiam me colocar para trabalhar - tocador de tuba em parada militar e assistente de dentista de cachorro ainda levam vantagem. Como essa vida é um vale de lágrimas, tratei de enfrentar o caos, o perigo, o calor, a fumaça, o pó, os soldadores malucos e os demais portugueses do local.

Com as férias iminentes de parte dos lusitanos, tive de passar muito além da Taprobana para buscar algo a fazer lá pelos lados do Além-Caldeira 8. O Paulo Silvino e o Pacheco (personagem novo; descrição breve, típico português com bigode "andorinha", com cara de dono de padaria), nas palavras do soldador, "estão a passar os dias a ver quem faz menos". Fato, os caras enrolam o quanto podem. Melhor para mim, ajudar folgado é simples, nesse caso.

Tentando fingir que fazia alguma coisa, fiquei procurando uma pá para recolher o lixo varrido. Como já disse antes, o lugar é meio inóspito, sujo, bagunçado, apertado...Seria uma variante para a agulha no palheiro, a pá na caldeira. Gastei um bom tempo tentando lembrar também como se diz pá em francês. Não consegui uma coisa nem outra, apesar de circular por cada cantinho da obra. Demos um outro jeito de tirar o entulho e voltei para meu ócio.

De repente, enfio a mão no bolso e percebo que a chave do meu cadeado tinha sumido. Se achar a pá era impossível, melhor nem falar da chave. Fui falar com o segurança ("não sei onde ela caiu, andei por toda a fábrica procurando uma...um...bom, um negócio"), anunciaram no sistema de som, mas como metade da fábrica fala português, metade fala italiano e o terço restante também não entende francês direito, eu não tinha esperanças.

Antes de sair para jogar o lixo no caminhão de entulho (pois é, virei lixeiro!), ouvi o sistema de som dizer algo como "Santorô". Eles repetiram, prestei mais atenção, era só a ordem para alguém passar no "bureau" (escritório). Quando eu tinha certeza que meu dia não podia ficar pior, veio o chave, digo, o chefe, me mandar para o curso obrigatório de segurança...

Eu e dois operários de outro setor, recém chegados, vimos um vídeo estúpido e depois tivemos que responder questões do nivel CFC. Comecei a pensar besteira durante as perguntas da provinha, inventando novas questões, "O que fazer se você machucar o dedo? Lavar sozinho, chamar um colega, passar na enfermaria ou cortar fora com a rebarbeira pequena?", quase errei umas por falta de atenção. Fui aprovado, com honras, e agora vou receber um selo de segurança no meu capecete.

Não percam, amanhã, em mais um capítulo de "Um operário muito estranho", a revelação de Pacheco e o sonho do soldador...

domingo, julho 23, 2006

So' pro fim de semana não passar em branco

O Palmeiras ganhou do Goias no Serra Dourada. Se a minha memoria não falha, é a primeira vez no milênio, ou pelo menos desde 2002, acho.

Não que isso mude muita coisa na vida dos leitores, claro.

Ja' disse isso, mas o que explica a diferença entre o time de hoje e o da minha infância é que naquele tempo era o Evair, e não o Edmundo, o cobrador de pênaltis.

Admito, o poderia ter passado sem esse post.

quarta-feira, julho 19, 2006

Ó Bruno

Em termos de compreensão auditiva, acho que depois do português vem o francês, o inglês, o espanhol e aí, finalmente, o português de Portugal. E pá, mesmo assim estou a trabalhar com os lusos.

No primeiro dia não fiz nada, hoje também não tinha grande coisa a meu alcance. Não sei soldar, não sei polir, não sei cortar, não sei nem o nome das peças (aliás, preciso de um dicionário técnico Português de Portugal/ Brasileiro. Até porca tem outro nome para eles!). Ajudo a carregar umas coisas, aperto uns parafusos, converso com a "malta"...

Minha primeira impressão é que eles eram uma massa explorada e sofrida. Estava até pensando em fazer uma anáilise aprofundada dos diferentes estratos sociais, ou seja, os lusos, os italianos, os árabes e os negros (não vi nenhum francês por lá...). 11 horas de jornada de trabalho diária, calor quase insuportável, poeira..Um deles, que parece o Paulo Silvino, tinha dito que trabalhar ali só valia pelo dinheiro, ganhava-se em 2 dias e meio o que se ganha em um mês em Portugal. Achei que fosse exageiro.

Hoje eu passei boa parte do tempo ao lado de um soldador, Veloso (ainda não comentei com ele a respeito do goleiro, vai chegar o momento...). Parece ser o gajo com mais noção ali, mas é meio brigado com quase todos os outros. Quando eu cheguei ele bateu continência para mim, achei que fosse desrespeito mas era só piada. Bom, o cidadão me disse que eles ganham 19 euros por hora. Façam as contas, caros leitores, incluindo ainda o fato de que eles trabalham 6 horas aos sábados...(4750 em julho, para os preguiçosos ).

Nessas horas dói vir do Terceiro Mundo. Tinha dito que o Nordeste era belíssimo mas um pouco caro, esse maluco, que lembra o Zacarias, perguntou se com uns 2000€ dava pra passar umas boas férias...

Vou parar de reclamar do fato de que um pedreiro ganha mais que 99% da população brasileira...Melhor concentrar meus esforços em entender o que eles estão falando e ganhar umas outras histórias inacreditáveis para contar. Me sinto numa mistura de programa humorístico (por razões evidentes), com filme de ficção daqueles que se passam dentro de fábricas, tipo Exterminador do Futuro e com um quê de Eça de Queirós. Por enquanto, sigo sendo chamado de "ó Bruno". É uma pena que não tenha nenhum Esteves...

segunda-feira, julho 17, 2006

A grande duvida existencial da minha vida é: eu sou atrapalhado ou eu simplesmente atraio pessoas atrapalhadas para o meu redor?

Os polytechniciens são, na visão dos franceses, cidadãos privilegiados. Alphas, para usar a nomenclatura do Huxley. No entanto, para que eles sejam conscientes das dificuldades enfrentadas pelas camadas baixas da população, todos devem efetuar um estagio "operario" de um mês. Essa idéia de viver um tempo como um gama me parecia meio inutil, mas era preciso encarar.

Arranjei um contato em Grenoble (perto da fronteira com a Suiça). Sem ajuda nenhuma da empresa, arranjei um albergue pra passaar o mês, comprei o bilhete de trem com antecedência. Tudo bonitinho e não remunerado.

Fui para la' ontem, para reconhecer o terreno, levar as tralhas (um mês de roupa é muito...), encontrar a empresa. Fiz tudo isso em meio a uma onda de calor brava...Aguentei um alemão meio bizarro que dividiu o quarto comigo essa noite, acordei cedo pra caralho. O prédio estava sem luz, nao dava pra abrir a janela, elétrica. Se virando nas trevas, lição 1.

Me vesti igual gente, perdi a chave do quarto. Passei 10 minutos procurando, achei; perdi a carteira. Praguejei. Rezei. Entrei em desespero. Pensei em olhar nas coisas do alemão. Achei.

Sai do quarto, o alemão veio atras: tinha perdido a bermuda. Corri do albergue pra nao perder o busão, nem tomei café. Desci no ponto errado, tive que correr até a estação de trem. Trem maldito atrasa 30 minutos. Chego na empresa um minuto antes do combinado, perfeito, estou sobrevivendo.

Olho para o portão, ninguém. Nada de guardinha para dizer "Bonjour, je suis le nouveau stagiaire". Entro na empresa. Encontro um cidadão, ele diz que o responsavel do meu estagio ainda nao tinha chegado. Espero o filha da puta por 30 minutos.

Quando ele chega, percebo um certo desconforto no ar...O fato é que ele nao tinha me dito o que eu ia fazer exatamente porque ele também não sabia...Fomos até o "atelier", não sei o nome exato disso em português; seria um galpão onde se produzem realmente as peças. Ninguém trabalhando. O chefe do lugar fala que nao tem nada mesmo pra fazer la', estão sem pedidos, nada de atividade.

O chefe sai comigo a tiracolo tentando achar um lugar onde eu pudesse trabalahr. "Bureau des études", ele propõe. Pergunta se eu sei mexer com AutoCad. "Não", respondo, lacônico. E lidar com plantas? "Também não". Mas não ensinam essas coisas na Polytechnique? "Olha, talvez no terceiro ano. Mas pra falar a verdade eu faço quimica la', então não rola".

Deve haver alguma lei que impede as pessoas de alegar que estudam quimica como legitima defesa em caso de trabalho chato. Deu certo, pelo menos. Continuamos andando, "Você sabe mexer com eletricidade?". Imagino a manchete daqui a algumas semanas, "Brasileiro causa explosão em industria francesa, 5 mortos. 'Ele não sabia nem o que é um fusivel', diz amigo".

O cidadão percebe que eu sou um inutil e despreparado. O chefe do departamento elétrico diz que um polytechnicien so' poderia trabalhar na diretoria, bla bla bla. Meu chefe pede para eu parar de seguir ele e se tranca numa sala com um outro cara. Espero mais um bocado...Ele sai, sobe umas escadas. Continuo esperando. Depois de muito, uma solução.

Entro no escritorio do M. Pereirá. "E se você fosse trabalhar com uns portugueses em Paris?"

Voilà, fui pra Grenoble à toa. Gastei os tubos em trem, reserva de albergue (não reembonsavel), trem local (comprei bilhetes para o resto da semana), para ouvir que tinha que voltar para casa. Enquanto ele explicava minha função, tirou uma lista de tarefas a serem feitas. "Você fala italiano?"

Me senti como naquelas propagandas de requalificação de pessoas no mercado, eu não tenho nenhum dos pré-requisitos. Não basta ser quase poliglota, saber uns rudimentos de fisica e quimica, ter feito historia da arte, ser um goleiro frustrado, as empresas sempre exigem coisas que não estão ao alcance.

O cara me ajudou a traduzir, me deu uma carona até o albergue, depois peguei meu trem ("você vai ter que pagar bem mais caro", anunciou, com um sorriso, a mocinha que trocava meu bilhete de retorno) e amanhã começo meu estagio linguistico de português.

"O pesadelo do outro é pior. Você, pelo menos, está em casa".

sábado, julho 15, 2006

Justificativa

O timing de uma piada é uma das condições mais importantes para que ela seja engraçada. Assim, quando eu estava sentado num banco da estação central de trens de Berlim nas primeiras horas da segunda passada, esperando o ICE (TGV alemão), pensei que não tinha nada que eu pudesse comentar a respeito da final.

Seria chover no molhado, comentar com atraso, encher o saco do publico. O gênio francês, que quase colocara tudo a perder com sua cobrança retardada de pênalti, acabou com seu pais. A cabeçada, a expulsão, ele encerradno a carreira saindo de costas para a taça, a disputa de pênaltis vencida pela Italia, tudo isso ficara' na memoria das pessoas. O salvador que passa a vilão, de novo a salvador e por fim vilão, a cabeçada que encanta o mundo em 98 e choca a todos agora, tudo isso parece muito roteiro hollywoodiano...Vou me limitar, uma semana depois, a fazer meu balanço da copa. Seguem os principais numeros:

Conheço pessoas de 17 paises que disputaram o torneio.
2 bolões perdidos (6,50€)
1 chapéu ridiculo de Portugal comprado (quase, Felipão...)
45 jogos assistidos (ao menos um pedaço)
30 jogos assistidos com toda atenção
35 horas dentro de trens pela Alemanha
0 salsichões comidos
1 jornalista brasileiro conhecido
1 entrevista concedida à televisão alemã
3 segundos pulando achando que o pênalti do Zidane não tinha entrado
5 segundos pulando achando que a Italia tinha feito o segundo
2 gols sofridos pela Italia durante toda a Copa (um contra e um de pênalti...)
2 finais com gols de Zidane (como Pelé...)
3 cabeçadas certeiras em finais
2 copas em que o Zizou foi expulso
2010 anos que a França vai ter que esperar pra ser campeã de novo
2 gols de Materazzi, artilheiro da Italia (Dio Santo!)
6 cidades alemãs e uma holandesa visitadas
60 milhões de franceses chorando
14 pontos ganhos pelos italianos (de 21 possiveis; a titulo de comparação, o Brasil ganhou os 21 em 2002, 17 em 94 a França, 15 em 98).
5 gols do artilheiro, pior marca em 40 e tantos anos

sábado, julho 08, 2006

Berlin, Berlin, nous allons à Berlin (06/07)

Sistema caótico é aquele que apresenta grande sensibilidade às condições iniciais. Assim, duas posições de partida muito próximas podem originar resultados completamente divergentes depois de pouco tempo.

Numa Copa do Mundo, em que apenas 7 jogos decidem 4 anos, a teoria do caos aconselha apenas que se tome cuidado com os detalhes. E com os árbitros, claro. A final anunciada para domingo era um belo e redentor, para eles, Brasil e Alemanha. Manteria a hegemonia deles em casa, a gente diria que foi roubado e o mundo continuaria numa boa. Porém, aqueles senhoires de preto interferiram cabalmente no destino da copa...

Consideremos primeiro aquele Itália e Austrália. Azzurra com um a menos, se o juizão não inventasse o pênalti no Grosso (candidato desde já a ocupar a vaga do Roberto Carlos como melhor lateral esquerdo do mundo, só por ser um predestinado e não por jogar bola) a Austrália pressionaria na prorrogação e mesmo que não marcasse chegaria mais inteira para os pênaltis. Claro que tudo isso não quer dizer nada pois o Buffon é um monstro, fica apenas como princípio de teoria conspiratória.

O caso francês é parecido, a falta que o Henry fez no Puyol e conseguiu convencer o juiz a marcar a favor dos bleus é histórica. Aliás, depois do pênalti de hoje dava pra ele ganhar um Oscar ou um Globo de Ouro (como comédia ou drama, fica a cargo do leitor).

Fiquei supreso com a derrota do Felipão, claro que ele ~e mortal e falível mas achei por umas horas que ele sairia invicto de outra copa, perdendoa a final nos pênaltis...Portugal perdeu mas ainda acho que rola um remake de 94. Os franceses fizeram 8 e tomaram 2, os italianos foram ainda mais...italianos (11 a 1). Um belo ataque para uma Itália da vida...

Será um confronto azul e sonolento. Creio que não preciso explicar nenhum dos dois adjetivos, apesar dos bleus estarem de branco e de não ter azul na bandeira da Itália e toda aquela história da família real...

O "sonolento", no entanto, merece um comentário extra. Durante o jogo eu até pensei em fazer uma ode ao 451 se Portugal ganhasse. É a evolução natural do 433 com os pontas recuando ao extremo, só que não me agrada...Se se tem sorte, um bom jogo aéreo e a ajuda do juiz pode funcionar.

A rigor, a Itália jogou na primeira fase com dois homens de área (Toni e Gilardino) e o Totti um pouco mais atrás, o que também não funcionou muito. Trocou o Gilardino pelo Camoranesi, um meia com com facilidade no apoio ao ataque, mas ganhou da Alemanha depois de instalar um famigerado quadrado mágico (Gilardino, Iaquinta, Del Piero e Totti), seria quase um esquema normal se não fosse pelos dois gladiadores Gattuso e Materazzi lá atrás.

A França é bem mais covarde, o Trezeguet só entrou contra o Togo, por exemplo. Um ataque débil demais para a defesa italiana...

É triste ver que hoje em dia colocar dois meias e dois atacantes é ousadia. Isso era normal na minha infância e parecia consolidado nos últimos tempos, mesmo na Europa, com a única diferença que aqui os meias são, por vezes, quase pontas.

Resta torcer para que o sucesso do campeão, seja lá qual for, não estimule mais os ferrolhos mundo afora. E, principalmente, resta torcer para que o campeão seja o azul certo. Parabéms Itália, novo tetra! Provoque mais fraudes em seu campeonato, parece que faz bem...

(Observação ao leitor descrente: esse texto foi realmente escrito voltando de Munique, antes, portanto, da final. Não consegui digitar antes, me desculpem, agora perdeu a graça. Impressionante ter dito que o Grosso era um predestinado, ficou mais forte do que eu esperava...)

sexta-feira, julho 07, 2006

Não chore por mim, Alemanha (05/07)

Dando sequência ao plano maluco de percorrer a Alemanha durante a Copa, parti para Dortmund. Antes da história em si, uma pequena pergunta, caro leitor: Alemanha e Itália, semi-final de Copa, o que isso te diz? Ou você respondeu" nada" ou "prorrogação inacreditável". Eu ficaria com a segunda, claro, não por ontem, mas por 70 (Beckenbauer com ombro deslocado, 4 a 3 Itália, talvez o melhor jogo da história das Copas).

Pois bem, os alemçaes se acreditavam invencíveis, e eu acreditava neles. Torcia, no entanto, pela Azzurra, por questões de sangue e por preferência e por uma Berlim mais tranqüila no sábado. Chego na praça principal de Dortmund 3 horas e meia antes do jogo. Lugar lotado, escolho (parênteses curioso: texto escrito num trem alemão à uma e meia da madrugada, ouvindo "caiu na rede é peixe" de um grupo de corinthianos no fundo do vagão) um pedacinho de chão próximo da sombra. Depois de algum tempo, ela finalmente chega em mim, assim como milhões de alemães.

Em termos de calor, densidade de pessoas, quantidade de cerveja bebida, músicas que eu me recuso a cantar por princípios ideológicos e camisetas pretas e brancas, a única comparação possível com o dia de hoje seria uma apuração de notas na Gaviões.

Desisti do meu bom lugar para conseguir algum espaço para sentar antes do jogo. Disfarçar que eu estava torcendo para a Itália foi fácil, o jogo não foi dos mais emocionantes. Até que, quando eu pensava que a relação com o clássico de 70 seriam as duas bolas na trave em dois minutos ("me dê a mão, me abraça, viaja comigo pro céu..." realmente a comparação era boa), coisa que eu nunca tinha visto na vida, mas de repente o Grosso chuta e é gol!

O leitor que não estava no Maracanã em 50 não deve ter muita noção do que é ver um país anfitrião ser eliminado assim. Silêncio quase completo, alguns gritos de "A Alemanha vai fazer um gol", "Deutschland, Deutschland" (no mesmo ritmo de "Olê, Porco"). E quando eu tinha certeza de que não seria uma prorrogação tão especial assim o Del Piero dá aquele belo toque. Gol, gol!

Gol não gritado é uma coisa muito estranha...

Saí forçando uma cara de desolado. Ao invés de apanhar, descobri, porém, como começou a Segunda Guerra: nunca menospreze alemães derrotados...Uns gritos de "merda italiana" (ou "italianos de merda", nunca fui bom com declinações) começaram a tomar corpo, depois uns "Super Deutschland" chegaram também.

Deu medo da estação central lotadíssima de alemães e seus gritos nacionalistas de derrota. Neste momento, dentro do trem, eles estão mais "República de Weimar", quietinhos...Mas um dia eles ainda acordam e conquistam a Europa. Passarão certamente pela França mas talvez fiquem presos nas defesas italianas...

"Pero meten goles y no los toman", acabou de dizer um hispânico aqui atrás. Belo time italiano, de fato, não me lembro de nenhuma outra equipe deles tão boa assim...Cravo, no entanto, meu palpite no Scolari: Nossa Senhora do Caravaggio já tirou Brasil e Alemanha do caminho, dos azuis que sobraram o Ricardo cuida.

(Nota do autor:achei que seria desonesto mudar o final de texto depois do resultado dos lusitanos...Não foi dessa vez que Dom Sebastião voltou, continuemos esperando)

segunda-feira, julho 03, 2006

Le jour de gloire est arrivé...

Viva, meus caros, hoje este belo espaço laranja completa quatro anos! Viva!

Pensando bem, quase nada mudou nos últimos quatro anos: o Lula está para ser eleito de novo (não estou te provocando, mãe...) vencendo o candidato inexpressivo do PSDB, o Felipão ganhando a copa, o Palestra sendo rebaixado, seis meses faltando para o final da escola...

Claro que, 21000 visitas e 1441 dias depois (teve um ano bissexto por ai) algumas coisas mudam...

E nesse eterno ir e vir de enrolações, palavras quase bonitas e reclamações sem necessidade passamos esses anos nos divertindo com as desgraças futebolisticas, as intempéries climaticas, catastrofes naturais e eu não sei mais do que estou falando...Voltando ao ponto, gostaria apenas de agradecer essa imensa massa de leitores que não para de crescer, ávidas pelas histórias non-sense desta combinação linear de engenheiro e jornalista esportivo, palhaço e dramaturgo, pessimista e azarado...

Sem maiores elogios a mim mesmo, apesar de eu ser essa tão nobre figura que todos amam tanto, termino o texto esperando que em 2010 comemoremos os oito anos durante a copa, vencendo a França, porra!

domingo, julho 02, 2006

Mesa redonda futebol debate

Talvez a melhor coisa das copas sejam as mesa redondas que ficam debatendo ad infnitum cada infímo lance do jogo, encontrando explicações complexas e conspiratórias para as derrotas, delirando em caso de vitória, culpando juízes e, principalmente, fazendo a transição entre o clima de festa do jogo e a dura realidade da semana que logo vai começar. Perdi, por razões óbvias, os debates brasileiros desta copa. Até ontem, claro.

Podendo sentar em qualquer lugar do trem que saia de Frankfurt para Colonia, acabei ficando proximo a um grupo de brasileiros que assistiu o jogo no campo. O vagão do trem é daqueles com regiões que parecem uma sala de estar, as pessoas ficam de frente umas para as outras. Quando o trem já estava partindo, chegou um cidadão com ares de nordestino, duas cervejas na mão, uma camisa verde e uma imensa credencial de imprensa pendurada no pescoço. Paulo César Coelho, correspondente do Diario do Nordeste na copa.

O grupo inicial de brasileiros, vim a saber depois, era a família de um ex-vice presidente do Santos cujo nome me escapa. Procurei na internet assim que possível.

Estava, pois, montado o cenário ideal. A situação de derrota, um lerdíssimo trem cruzando a Alemanha, convidados do meio esportivo. Fizemos nosso programa, sem câmeras, infelizmente.
Apesar da derrota, éramos todos brasileiros e a única coisa a fazer era rir da situação. Entre cornetadas nas orelhas dos franceses que ameaçavam puxar um Allez les bleus, o jornalista deixou escapar um belo "vai tomar no cu" para um francés com a 12 do Henry. "Não existe imparcialidade em cobertura da seleção", justificou-se. Claro que isso nunca foi questionado, o verde-amarelo da camiseta por baixo da camisa denunciava que era apenas um torcedor cobrindo a participação de seu time.Passamos 4 horas onde lavamos nossa alma ofendendo o Parreira e nos divertindo, afinal isso aqui deveria ser apenas uma grande festa.



Descendo do trem, um outro grupo de brasileiro começou a batucar num pandeiro, uns mais empolgados dançavam...Não existe povo como o brasileiro, para a sorte do resto do mundo. Não cito aqui nossa inevitável tendência a levar vantagem em cima de tudo, a preguiça, a corrupção institucionalizada, mas sim essa capacidade de rir da desgraça e sambar para os problemas. Ah, se fizéssemos bom uso disso, aprendessemos a defender cruzamentos e colocassemos Robinho em campo logo depois de tomar o gol, ninguém jamais nos seguraria.

"A gente perdeu da França. E a França é ruim"

Ouvi essa frase de um sábio torcedor brasileiro desconhecido, no meio da massa amarela e derrotada em Frankfurt. Mesmo se isso resume bem a situação, é apenas uma bela piada, é preciso dar maiores detalhes.

A cidade de Frankfurt tem alguns telões na região da margem do Reno. O mais bonito deles, que fica literalmente sobre as aguas, estava com a arquibancada já completamente ocupada para Portugal e Inglaterra. O jeito foi ir para um outro, mais discreto, onde todos ficavam realmente em pé. No caminho até lá, ouvi diversas referências à minha camiseta palestrina, desde os triviais "Bela camisa" até um mais empolgado que começou a declamar o hino com emoção. Um calor de primavera brasileira, um sol inclemente para quem se acostumou com meses de inverno europeu, um ataque português ineficiente que obrigava a partida a ir para os pênaltis, tudo isso dava um certo clima de "Ah, esperava mais da copa". Mas é claro que o grande evento do dia ainda estava para chegar...

Aos poucos, depois dos milagres do grande Ricardo (vide post sobre o cidadão em junho de 2004), a festa começava a se transformar em Bleu, Blanc, Rouge, verde e amarelo. A torcida brasileira, pelo simples fato de ter nascido nesse país maravilhoso, tratou de provocar os adversários desde o início. Em meio a "Au revoir, les bleus" e "Ei, Zizou, vai tomar no cu", era claro que aquilo não poderia terminar muito bem...

Depois dos hinos e dos primeiros bons 3 minutos da seleção, a torcida começou a murchar. Admito que gritar em frente a um telão é ainda mais estúpido que fazê-lo no estádio, mas a sensação de desastre eminente crescia enquanto a nossa zaga tocava bola lentamente e os franceses começavam a gostar do jogo. Ocupando assim o relativo vazio deixado pela massa brasileira, eles se empolgavam cada vez mais com seus gritos de guerra.

É curioso que eles cantam o próprio hino durante a partida, como os times brasileiros de futebol fazem. Digo que é curioso porque ao invés de ser uma coleção de frases rebuscadas, palavras que já caíram em desusos e inversôes desnecessárias, o hino deles é simplesmente um canto de guerra. Ouvir "Vocês não estão escutando esses ferozes soldados? Eles vêm até os seus braços para degolar seus filhos e sua mulher" durante uma partida de futebol dá um certo medo.
Cada escanteio era uma tortura, Zidane no primeiro pau e o mundo inteiro acreditando num replay de 98. Curiosamente o gol deles saiu quando o maior gênio do futebol francês resolveu efeturar o lançamento em nossa área e encontrou um Henry tão livre, mas tão livre que deu até vergonha de ser brasileiro. O adversário joga com UM atacante e se tem a ousadia de deixá-lo livre na entrada da área.

A partir daí o clima de vingança foi substituido por uma frustração e incredubilidade, não era possível perder para eles, de novo. PARA ELES! E DE NOVO!

Boa parte dos brasileiros (este que vos escreve incluso) pulou junto com o Adriano, literalmente, naquele último cruzamento. Mas quem ganha com bola cruzada na área são eles, já deveríamos saber disso...Só restava voltar pra estação de trem, onde ouvi o veredicto da noite: "Esse aí tá na merda, além de brasileiro é palmeirense".

É difícil descrever a festa francesa, povo blasé por natureza mas em estado de glória depois da vitória. Eles, como bons arrogantes, acreditam piamente que jogam mais bola que nós. Ontem isso foi verdade, e se eu pretendia ver a aposentadoria do Zidane saio algo feliz por ter acompanhado uma exibição memorável deste monstro...Evidentemente, vou ter que agüentar pelos próximos meses que a França é o melhor time do mundo e que nós, brasileiros idiotas, nunca aprenderemos a marcar o ataque adversário numa jogada de bola parada.

Só nos resta torcer para o Felipão...